Opinião: Miguel M. Riscado | «Abertzalismo» regional
Por Jornal Fórum
Publicado em 29/10/2025 18:37
Opinião

Um problema contemporâneo nacional é a desertificação e esquecimento do Interior. O apogeu dessa decadência é a resposta à pergunta tantas vezes feita entre mães. Quando questionadas sobre o paradeiro dos filhos, respondem que estes “já estão em Lisboa”. Essa afirmação comporta duas características que reafirmam a decadência do Interior. A primeira é a alegada subida no estrato social com a migração para a capital; a segunda é a vangloriação da ausência, da distância, isto é, a troca do Interior pelo capital. Subjacente a toda esta hipotética conversa – ainda que baseada em conversas ouvidas – é a auto-depreciação das gentes do Interior.  

Penso que esta situação demonstra um crise de identidade regional. Falta uma identidade «abertzale» ao Interior. 

O termo «abertzale» foi cunhado por Sabino Arana, pai do nacionalismo basco como o conhecemos atualmente, e significa patriota ou nacionalista em basco. A conceptualização, contudo, não é alheia à realidade subjacente. O termo foi empregue sistematicamente para a caracterização da esquerda revolucionária radical basca, não só do ponto de vista político, mas também militar. A Euskadi Ta Askatasuna, do ponto de vista político-militar e os partidos da Esquerda «Abertzale», como o Partido Nacionalista Vasco, o (Herri) Batasuna, marcaram uma visão «abertzalista» com recurso à violência contra civis, à desordem e à conivência política com essas realidades, sem prejuízo da sua democratização depois, em coligações, mais recentes, como Bildu e Amaiur. Não é, seguramente, à primeira parte que me refiro quando apelo a um Interior «abertzale». 

É certo que o povo basco tem, até do ponto de vista genético, diferenças substanciais com os outros povos da Península Ibérica. Com uma origem quase ancestral, uma língua que não brotou do Proto-Europeu e uma cultura única, demonstram, na sua face saudável e apenas nessa, um exemplo de valorização regional (ou mesmo nacional, para os defensores do Estado Basco). Um grande exemplo disso mesmo é a política de jogadores do Athletic Club. Apenas jogadores com origem basca, formação em clubes da região ou ancestralidade podem representar o clube. Não se trata de um política elitista e de exclusão, mas sim de manutenção da própria identidade e da tradição inicial. E, ainda que pareça um contrassenso, não se limita a jogadores espanhóis. Bixente Lizarazu, campeão mundial em 1998 pela França e, mais recentemente, Iñaki Williams, internacional pelo Ghana, são exemplos de atletas nascidos na zona do Grande País Basco (Euskal Herria) que se estabeleceram na equipa principal do clube nunca despromovido. Assim, não revela tanto uma competição, mas sim (quase) uma realidade de alternatividade. É indiferente se certo local pertence, no caso, a Espanha ou a França – importa apenas a sua pertença ao País Basco. É esta relação que o Interior deve adotar em comunicação com as metrópoles.  

É com base nestes contributos «abertzales» que o Interior pode crescer. A cultura e a presença do Interior não pode ser lembrada com saudosismo – tem, na verdade, de ser vivida, no presente, com valorização do rico passado e com planificação para o futuro. O potencial já não basta. É preciso concretização. E essa, tem de partir das pessoas do Interior. 

 

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