Opinião: João de Jesus Nunes | OS 40 MÁRTIRES DO BRASIL E O BEATO FRANCISCO ÁLVARES
O CARDADOR DA COVILHÃ QUE DEU A VIDA PELA FÉ
Por Jornal Fórum
Publicado em 06/11/2025 10:32
Opinião

Em meados do século XVI, Portugal vivia o auge das grandes viagens e da expansão missionária. 

Em 1570, um grupo de 40 missionários jesuítas, liderados por Inácio de Azevedo, partiu de Lisboa rumo ao Brasil com o propósito de evangelizar as novas terras. Jovens de várias origens e profissões – estudantes, artesãos, músicos e trabalhadores – formavam aquela que foi a maior expedição missionária jamais enviada por Portugal. 

Depois de meses de preparação na Quinta do Val do Rosal, na Charneca da Caparica, a 5 de junho de 1570 embarcaram na nau Santiago. Ao largo das Canárias, a 15 de julho de 1570, foram atacados por corsários franceses comandados por Jacques Soria, um calvinista ao serviço da rainha de Navarra. Recusando renegar a fé, os jesuítas foram assassinados e lançados ao mar, entoando cânticos e orações.  

Entre eles encontrava-se Francisco Álvares, natural da Covilhã. Estavam então reunidos os 40 companheiros na nau Santiago. 

A 5 de junho do ano de 1570, a armada deixou a barra de Lisboa, rumo ao imenso oceano, que era a estrada que os deveria levar ao Brasil. Levaram sete dias até chegarem à Ilha da Madeira. 

Naquele sábado, 15 de julho de 1570, do promissor grupo de 40 missionários, que o padre Inácio de Azevedo preparara tão esforçadamente para evangelizar os territórios do imenso Brasil, só mesmo escapara à morte o irmão João Sanches, que haveria de ser a testemunha do martírio dos 40 companheiros. 

Os Mártires 

Um cardador que sonhou ser missionário 

ÁLVARES, irmão auxiliar, Francisco – português, nascido na Covilhã em 1539, tendo entrado para a Companhia em 1554, em Évora. Era por ofício cardador. A cidade era um dos grandes centros da indústria de lanifícios portuguesa. Dedicava-se à cardação, um ofício modesto, mas essencial, símbolo do esforço e da dignidade do trabalho, partilhando a vida simples e laboriosa dos operários têxteis da sua terra. Homem de fé viva e carácter humilde, sentiu o chamamento de Deus e decidiu consagrar-se à vida religiosa, ingressando na Companhia de Jesus como irmão coadjutor – um dos jesuítas leigos que apoiavam as missões com o trabalho manual e o testemunho de vida.  O seu destino cruzou-se com o padre Inácio de Azevedo, visitador das missões jesuítas no Brasil, que regressara a Portugal para recrutar novos missionários. Francisco Álvares             respondeu ao apelo e alistou-se na expedição missionária, integrando o grupo dos “companheiros do Brasil, que partiria de Lisboa em 1570.  

O martírio em alto-mar 

A viagem decorreu sob ameaça constante. As rotas atlânticas eram frequentadas por corsários e piratas, muitos deles a soldo das potências protestantes que viam nos jesuítas inimigos da sua causa. 

A 15 de julho de 1570, quando a nau Santiago, comandada por Inácio de Azevedo, navegava ao largo da ilha de La Palma, nas Canárias, foi atacada por corsários franceses sob o comando de Jacques Soria, um calvinista feroz. 

Os jesuítas recusaram renegar a fé católica. Um a um, foram mortos e lançados ao mar – alguns ainda com vida – entoando cânticos e orações. 

O covilhanense Francisco Álvares foi lançado vivo ao mar. 

Os restantes companheiros 

ADAUTO, irmão, João – português, de Entre Douro e Minho, sobrinho do capitão da nau Santiago, foi confundido com os jesuítas, mas aceitou o martírio por desejar entrar para a Companhia. Foi lançado vivo ao mar. 

ÁLVARES, irmão auxiliar, Gaspar – português, do Porto. Apunhalado, foi lançado vivo ao mar. 

ÁLVARES, irmão auxiliar, Manuel português, de Extremoz, nasceu em 1536 e entrou para a Companhia em 1559, em Évora. Era pastor de ofício. Foi lançado vivo ao mar. 

ANDRADE, padre Diogo deportuguês, de Pedrógão Grande, nasceu em 1531 e entrou para a Companhia em 1558, em Coimbra. Foi soto-ministro no Colégio de Coimbra e depois no de Santo Antão, em Lisboa. Exercia o ofício de ministro. Foi apunhalado e lançado ainda vivo ao mar. 

AZEVEDO, padre Inácio de – português, do Porto, nasceu em 1526 e entrou para a Companhia em 1548, em Coimbra. Foi Visitador do Brasil e o mentor do grupo de missionários que levava como Provincial do Brasil, nomeado pelo Padre Geral. 

BAENA, irmão auxiliar, Afonse deespanhol, de Villalobas (Toledo), nasceu em 1539 e entrou para a Companhia em 1567. Era de profissão ourives e foi lançado vivo ao mar.  

CALDEIRA, irmão estudante, Marcos – português, de Santa Maria da Feira, nasceu em 1547 e entrou para a Companhia em 1569. Foi lançado vivo ao mar. 

CASTRO, irmão estudante, Bento de português, de Chacim (Macedo de Cavaleiros), nasceu em 1543 e entrou para a Companhia em 1561, em Lisboa. Em 1569, estudava filosofia em Coimbra. Era Mestre de noviços e encarregado da catequese. Ferido com tiros e punhaladas, foi lançado ainda vivo ao mar, sendo o primeiro mártir. 

CORREIA, irmão estudante, António – português, do Porto, nasceu em 1553 e entrou para a Companhia em 1569. Estava em oração, quando recebeu violenta estocada na cabeça e foi lançado vivo ao mar. 

CORREIA, irmão estudante, Luís português, de Évora. Foi lançado vivo ao mar. 

COSTA, irmão auxiliar, Simão da – português, do Porto, terá nascido por volta de 1551 e entrou para a Companhia pouco antes da viagem. Por ser noviço, ainda não trazia o hábito, no que foi tomado por filho de comerciante. Levado à presença de Sória, confirmou ser missionário, foi degolado e o seu corpo lançado ao mar a 16 de julho. 

DELGADO, irmão estudante, Aleixo – português, de Elvas, nasceu em 1555 e entrou para a Companhia em 1569, em Évora. Era excelente cantor e o mais jovem dos mártires. Foi lançado vivo ao mar. 

DINIS, irmão estudante, Nicolau – Português de Bragança, nasceu em 1553 e entrou para a Companhia em 1570, em Val de Rosal. Tinha boa arte para representar. Foi lançado vivo ao mar. 

ESCRIBANO, irmão auxiliar, Gregório – espanhol, de Viguera (Logroño). Foi lançado vivo ao mar. 

FERNANDES, irmão auxiliar, António – português, de Montemor-o-Novo, nasceu em 1552 e entrou para a Companhia em 1570. Em Val de Rosal, era chefe de oficina de carpintaria. Foi apunhalado e lançado vivo ao mar. 

FERNANDES, irmão auxiliar, Domingos português, de Borba, nasceu em 1551 e entrou para a Companhia em 1567, em Évora. Foi trespassado com uma lança e ainda vivo lançado ao mar. 

FERNANDES, irmão estudante, João – português, de Braga, nasceu em 1547 e entrou para a Companhia em 1569, em Coimbra. Foi lançado vivo ao mar. 

FERNANDES, irmão estudante, João – português, de Lisboa, nasceu em 1551 e entrou para a Companhia em 1568, em Coimbra. Foi lançado vivo ao mar. 

FERNANDES, irmão auxiliar, Manuel português, de Celorico da Beira. Foi lançado vivo ao mar. 

FONTOURA, irmão auxiliar, Pedro de – português, de Chaves. Estando em oração, recebeu uma cutilada no rosto que lhe cortou a língua, sendo depois lançado ao mar. 

GONÇALVES, irmão estudante, André português, de Viana d o Alentejo, tinha estudado na universidade de Évora. Foi lançado ao mar depois de apunhalado. 

GODOY, irmão estudante, Francisco Pérezespanhol. De Torrijos (Toledo), nasceu em 1540 e entrou para a Companhia em 1569. Era parente de Santa Teresa de Jesus (de Ávila). Bacharel em cânones pela Universidade de Salamanca, sabia música e tocava vários instrumentos. Apunhalado, foi lançado ainda vivo ao mar. 

HENRIQUES, irmão estudante, Gonçalo – português, do Porto, era diácono. Foi lançado ao mar. 

LOPES, irmão estudante, Simão – português, de Ourém, entrou para a Companhia durante a viagem. Foi lançado vivo ao mar. 

MAGALHÃES, irmão estudante, Francisco de – português, de Alcácer do Sal, nasceu em 1549 e entrou para a Companhia em 1568, em Évora. Tinha aptidão para bom administrador e excelente voz de tenor. Foi lançado vivo ao mar. 

MAIORGA, irmão auxiliar, João – espanhol, de S. Jean Pied de Port (na época do domínio de Navarra), nasceu em 1533 e entrou para a Companhia em 1568. Era pintor de ofício. Foi lançado vivo ao mar. 

MARTIM, irmão estudante, João de São – espanhol, de Yuncos (Toledo), nasceu em 1550 e entrou para a Companhia em 1570, em Évora, quando estudava na Universidade de Alcalá. Foi ferido e lançado vivo ao mar. 

MENDES, irmão estudante, Álvaro português, de Elvas, era excelente cantor. Foi lançado vivo ao mar. 

NUNES, irmão estudante, Pedro – português, de Fronteira. Foi lançado vivo ao mar. 

PACHECO, irmão estudante, Manuel português, de Ceuta. Foi lançado vivo ao mar. 

PIRES (Mimoso), irmão estudante, Diogo – português, de Nisa, frequentou o curso de filosofia na Universidade de Évora. Foi trespassado com uma lança e o seu corpo deitado ao mar. 

RIBEIRO, irmão auxiliar, Brás português, de Braga, nasceu em 1546 e entrou para a Companhia em 1569, no Porto. Estando recolhido a rezar, foi morto com uma cutilada na cabeça e o seu corpo lançado ao mar. 

RODRIGUES, irmão estudante, Luís português, de Évora, nasceu em 1554 e entrou para a Companhia em 1570, em Évora. Foi lançado vivo ao mar. 

RODRIGUES, irmão estudante, Manuel português, de Alcochete. Foi lançado vivo ao mar. 

SANCHES, irmão estudante, Fernando – espanhol, de Castela-a-Velha, foi estudante em Salamanca. Foi lançado vivo ao mar. 

SOARES, irmão estudante, António – português, de Trancoso, entrou para a Companhia em 1565, em Évora, onde passou todo o noviciado. Serviu como cozinheiro e enfermeiro e assumiu na nau o ofício de soto-ministro. Foi apunhalado e lançado vivo ao mar. 

VAZ, irmão auxiliar, Amaro – português, de Benfazer (Marco de Canavezes), nasceu em 1553 e entrou para a Companhia em 1569, no Porto. Foi lançado vivo ao mar, depois do seu corpo ser atravessado com punhaladas. 

ZAFRA, irmão auxiliar, João de – espanhol, de Jérez (Badajoz), entrou para a Companhia em 1570, em Évora. Foi lançado vivo ao mar. 

ZUDAIRE, irmão auxiliar, Estêvão espanhol, de Zudaire (Navarra). Tinha o ofício de bordador. Foi lançado vivo ao mar. 

Os 40 missionários ficaram conhecidos como Mártires do Brasil. O Papa Pio IX proclamou-os beatos a 11 de maio de 1854, e São João Paulo II recordou-os solenemente no Jubileu do Ano 2000, confirmando o seu culto. 

A memória destes jovens, que partiram com ardor apostólico e encontraram a morte no mar, é símbolo da coragem e da fé que animaram a primeira geração missionária portuguesa. Entre eles, o humilde cardador da Covilhã, Francisco Álvares, eleva o nome da sua terra como exemplo de fidelidade, serviço e entrega total a Deus. 

Fontes: Os 40 Mártires o Brasil, de Eduardo Kol de Carvalho, Wikipédia, Biblioteca- Arquivo Municipal da Covilhã. 

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