Opinião: Miguel M. Riscado | Conversas de Miguel
Por Jornal Fórum
Publicado em 20/11/2025 10:39
Opinião

Esta semana regressou um clássico do YouTube português para a sua terceira temporada. Carlos Coutinho Vilhena e Pedro Teixeira da Mota voltam com as suas Conversas de Miguel. Um podcast ligeiro, com muito humor, entre dois humoristas e, principalmente, amigos. A génese deste projeto, além da beleza artística, está, precisamente, nessa amizade. 

É verdade que o humor é beto. Um subgénero do humor português, extremamente focalizado em Lisboa, com referências sem fim. São essas referências que estendem o humor dos participantes a horizontes completamente imprevisíveis. A incisão e altivez de Teixeira da Mota, a perspicácia e imaginação fértil de Coutinho Vilhena, a dinâmica dos amigos com estórias reais de ambos, com aquele travinho de criação cirurgicamente colocada. É uma lufada de ar fresco, ainda que não necessariamente recente, no nosso panorama. De certa forma, a quebra da quarta parede entre artista e público. Aqueles são Pedro e Carlos, não bonecos criados para aparições públicas ou presenças em televisão. O público alvo percebe isso, com a consequência subjacente: a podridão dos meios clássicos de audiovisuais, com máscaras constantes e pouca transparência. A realidade e o “terra a terrismo” dos humoristas permite uma presença na conversa do espetador — é como uma câmara oculta de uma conversa entre velhos amigos. 

Há um paralelismo deste voyerismo consentido com o interesse do fã na vida do artista. Existe divisão, mas a curiosidade fala mais alta. Quando Peter Jackson ressuscitou as gravações de Michael Lindsay-Hogg do álbum Let it Be (e também Abbey Road, mas não tenho espaço agora para falar desse último álbum material e não formal) dos Beatles. Durante um dos longos episódios, surge uma conversa gravada com um microfone escondido num vaso pelo realizador original entre Lennon e McCartney. Discutiam o workaolismo de Paul, o controlo sobre George, o futuro da banda e o consequente fim a que estavam destinados. O destaque é a conversa, não entre dois dos maiores cantores-compositores de todos os tempos, mas entre dois amigos. Amigos de há muito tempo, num conversa como qualquer um de nós pode ter com um amigo. 

Também nós, em Conversas de Miguel, temos acesso, desta vez com permissão dos autores, às suas conversas. Não haja dúvidas que um passeio pela Baía de Cascais, onde estejam numa esplanada Carlos e Pedro, teria o mesmo conteúdo que uma Conversa de Miguel 

A autenticidade, a genuinidade, a falta de filtro e a naturalidade destas Conversas marca uma normalização da relação famoso/fã. É, contudo, mais que uma brincadeira de amigos. É um projeto sério, na leveza séria que marca as ações dos humoristas, sem preocupação com sucesso ou falhanço do mesmo. Aqui está o tesouro das Conversas de Miguel, como já estava nos Boomerang, no Bon Vivant ou no ask/watch.tm: os projetos valem por si mesmo. O importante é existirem. Este ato de criação, anti bloqueio mental, é a chave da nossa geração, desprovida de fantasmas inexistentes e opiniões de terceiros. Vejam as Conversas de Miguel — seguramente melhoram o seu dia e o título é, desde logo, apelativo (digo eu). 

 

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